terça-feira, 26 de agosto de 2014

Logo Ele..

                   
“Porque justamente ele? Ele era um vagabundo, ordinário. Um lindo ordinário. O jeito de andar era despojado, jogado. Era verdadeiramente um charme. Arrogante, estressado, idiota, com aquele olhar cativador, aquele sorriso de lado, que era assustadoramente perfeito. Perfeito. Mas porque ele? Não poderia ser o filho do açougueiro? Do padeiro? Do pedreiro? Mas era ele, aquele retardado, bobo e chato. Até o jeito de falar era diferente, cheio de gírias, palavrões. Palavrões até mesmo desconhecidos por ela. Porque não podia ter sido uma garota normal? E gostar de um garoto bonzinho, estudioso, bonito apenas. Sem aquele olhar tentador, aquele charme absurdo. E aquela pegada que ninguém mais tem. Arrepiou-se. Como ela podia gostar de alguém como ele? Não fazia nada pra agradar ninguém. Preguiçoso, estúpido, aquele tipo que não levava desaforo pra casa. Não era o tipo dela. Arrumada, maquiada, com suas roupas de marca. Perfumada, educada, toda perfeita. Ele era um vagabundo. “Deveria ter ouvido mamãe, não fique com ele!”, discutia com si mesma em pensamento. Com raiva, levantou-se da cama. Olhou novamente para ela, não iria retirar aquilo dali. Ele colocou, ele que a tirasse. Mas quantas vezes ela teria que falar? Não podia ser ao menos organizado? Atento e menos chato? Ele não era nada disso, ele era chato, e ao mesmo tempo carinhoso, mas não deixava de ser chato. Mas ela adorava isso. Sorriu abertamente, deixou-se aprofundar os pensamentos. Lembrou-se de quando ia ao seu apê, aos finais de semana, e ao chegar estava tudo jogado pelo chão, desarrumado, não sujo, mas desarrumado. Ele era desorganizado! Riu ao lembrar-se de como ele ficava desesperado quando ela chegava de repente e encontrava aquela bagunça toda, e ele catava tudo desesperadamente. “Agora não, tudo sou eu!” , pensou novamente, cruzando os braços. Era absurdamente desorganizado e chato. Um bico abriu-se em sua face. Respirou e sentou-se novamente na cama. Mas era dele o seu amor, foi com ele que viveu os momentos mais felizes de sua vida até então. Tão diferente dela, ele a completava. Era ele seu porto seguro, seu protetor, o mais chato de todos, mas era ele, quem lhe dava conselhos _ “que são uma porcaria!” , pensou aceitando os fatos, para logo sorrir. Não podia reclamar tanto assim. Deixou de se lamentar pela estupidez do amor, ela haveria de aceitar. A gente não escolhe quem amar. Ela o amava, olhou novamente para lateral da cama, levantou-se e recolheu o que tanto odiava. Todo santo dia era assim. Era aquela bendita toalha molhada sobre a cama. Sorriu. Afinal, sempre sonhou com isso. Não com a tolha molhada, mas em estar casada com ele. Dividindo o mesmo teto, o mesmo quarto, a mesma cama. Sabia que seria assim, então sorriu. Ele poderia ser o cara mais desorganizado do mundo, o mais chato, o mais besta, o mais imbecil, mas era o amor da vida dela.”

Conspirada

quarta-feira, 13 de agosto de 2014

Te encontrei.


E eu, finalmente, te encontrei. Te procurava havia anos, a muito tempo já vinha preparando minha vida pra sua chegada. Organizei tudo, afastei tudo o que atrasava, limpei o coração e perfumei a casa com incessos. E você, chegou, finalmente chegou. Tão do jeitinho que eu esperava que fosse, com todos os defeitos que eu adoro aceitar. Chegou e trouxe junto com você toda a esperança de um amor novinho em folha, uma nova chance de colorir tudo, de ocupar com todos os seus ares o espaço que havia aqui dentro. Logo eu, que achei que você nunca chegaria, depois de tanta demora e espera. E agora eu tenho tudo o que as princesas de contos de fadas morreriam de inveja: um príncipe só meu, cheio dos defeitos aceitáveis que encaixam minhas neuroses sem fim. Times opostos, gostos musicais diferentes, signos que não combinam segundo a astrologia. Eu esperei tanto tempo por isso, que confesso tenho medo de te perder. Porque é isso que acontece quando eu gosto demais: as pessoas resolvem partir e deixar um tanto de saudade. E, apesar de toda a insegurança, até quem me vê passar na rua sabe que eu estou amando, o quanto eu deixei o passado pra trás e o quanto valeu a pena eu investir no presente. O amor veio, te trouxe, pra ficar, pra mim. E ai dele se quiser te levar de volta. Logo eu, que só sei escrever sobre desilusões, resgatando a esperança do fundo do poço e escrevendo sobre o amor. Logo eu, que não sei nada sobre o amor, que não sei como é ser plural. Logo eu, que nem sei o verdadeiro significado da palavra reciprocidade dei pra achar que mereço te amar e ser amada da mesma forma e exclusivamente por você. Logo eu.

(De: Nathália Pereira)

segunda-feira, 4 de agosto de 2014

Talvez você volte, talvez não.




E talvez você volte. E então, finalmente, eu poderei te dizer tudo o que não te disse na última vez que nos vimos. Eu deveria ter te dito tanta coisa, expressado tanto sentimento, ter te mostrado a parte boa do meu eu, ter entregue a você tudo o que há de bom em mim. Mas por medo da falta de reciprocidade, eu deixei os atos e palavras escaparem, se perderem como se fossem nada, como se não fizessem diferença. E você se foi, sem nada. Sem ouvir saindo da minha boca algumas palavras que estão engasgadas na minha garganta e que, querendo ou não, você as ouviria ecoadas pelo vento em uma tarde solitária. Você se foi e só deixou um gosto de café amargo, essa saudade que preferiu se estacionar em mim. Saudade essa, que deita em teu lugar na minha cama, que insiste em ocupar o teu espaço no meu colo, que me acolhe e ao mesmo tempo, me destrói. Essa maldita saudade que quebra minhas forças, derrete o coração de pedra e traz lágrimas aos meus olhos. E agora, eu vou seguir a vida, carregando essa saudade imensa pela estrada e deixando um pouquinho em cada parada, em cada encontro. Eu vou perder, aos poucos, essa vontade do teu ser, essa esperança do retorno, esse grito pelo teu aconchego. Eu aprenderei a viver. Sem você, sem nós. Mas talvez você volte, e talvez eu já tenha espalhado toda a saudade que restara pela estrada. Talvez eu já esteja sentindo falta de um outro alguém, caminhando de um jeito novo, com um amor novinho em folha. Vai passar, eu sei que vai. Mas enquanto isso eu vou seguir, com a mesma saudade de ontem, de hoje e, se assim quiser o destino, talvez não de amanhã. Vou seguir, vou viver. Meu coração é teu, mas não acredito que por muito tempo. Vou viver, com toda essa incerteza do talvez, mas vou. Porque talvez você volte. Talvez não.